Pregões Incríveis: minutos de pânico das bolsas com supostos erros de ordens

04/08/2012 23:45

 

Por: Nathália A. Terra Pereira
07/05/10 - 15h35
InfoMoney

 

SÃO PAULO – Em acontecimentos verdadeiramente marcantes, não é preciso o passar do tempo para saber que se trata de um momento histórico. Aqueles envolvidos com o mercado financeiro provavelmente tiveram tal sensação na tarde da última quinta-feira, assunto desta edição do Pregões Incríveis, a série de reportagens da InfoMoney sobre momentos marcantes da história das bolsas.

A julgar pelo clima que predominava pela manhã, o pregão não tinha nada de muito atípico. Novas tensões em torno da situação fiscal grega bem como de outros países periféricos seguiam em evidência, trazendo trajetórias de queda às bolsas – um cenário um tanto quanto rotineiro nas últimas semanas.

A agência de classificação de risco Moody’s havia emitido novos alertas quanto ao risco de contágio da crise fiscal rumo a bancos de países como Portugal, Espanha e Itália, enquanto o parlamento da Grécia dava seu aval final a novas medidas de austeridade orçamentária, na tentativa de reduzir sua relação dívida pública/PIB e dar conta dos vencimentos de bonds que se aproximam. Em suma: um cenário de aversão ao risco, mas nada que já não vinha se configurando recentemente.

Outros destaques do noticiário ficavam para novos debates em torno da reforma do sistema financeiro norte-americano e a decisão do BCE (Banco Central Europeu) de manter a taxa básica de juro europeia em 1% ao ano, sem nenhuma palavra ativa sobre a possibilidade de a crise grega contaminar outras nações da Zona do Euro.

A súbita derrocada
Nesse contexto, as bolsas oscilavam entre quedas de 2% a 3%. Era o caso do principal índice de ações brasileiro, o Ibovespa, assim como de outros importantes índices europeus e dos benchmarks norte-americanos S&P 500, Nasdaq e Dow Jones. Até que pelo meio da tarde as quedas começaram a se intensificar, em um ritmo não mais espantoso do que a falta de qualquer fundamento que justificasse a súbita derrocada das bolsas.

A brusca queda nas bolsas de Wall Street teve início por volta das 15h00 de Brasília (14h00 no horário local). Os índices começaram a aprofundar suas trajetórias negativas em poucos minutos, em um mercado que assistia perplexo à intensificação dos recuos, até então, de razão desconhecida. Em menos de 30 minutos, o Dow Jones, por exemplo, caiu quase 1.000 pontos. O índice, que atingiu uma máxima de 10.879 pontos no intraday da sessão, chegou ao fundo de 9.869 pontos. A queda em pontos que levou o índice a desvalorização de 9,2% no intraday foi a maior da história.

Desempenhos similares foram apresentados por outros índices como o S&P 500 e o Nasdaq, puxando consigo a performance de outras bolsas ao redor do mundo, entre elas a brasileira. Aos poucos, rumores começaram a surgir na mídia e entre investidores: seria tudo um erro de ordem.

Um zero a mais
Enquanto os índices de ações marcavam suas mínimas no intraday, os rumores iam de fragilidade financeira de um grande gestor de recursos nos EUA a novo corte de rating de alguma nação europeia. As explicações, de que o mercado temia contágio agudo da crise fiscal grega, o que poderia virar uma nova versão do Lehman Brothers - basta lembrar os efeitos da quebra do banco sobre os mercados globais para entender tamanho temor.

Em pouco tempo ficou claro que o mercado estava num nível de tensão tamanho que toda aquela afobação era um efeito manada sem precedentes. Isto porque passada a busca pelo fundamento daquela derrocada instantânea das bolsas, começaram a surgir as especulações de que aquela súbita queda teria sido ocasionada por um erro de ordem cometido por um trader. Mais tarde, informações davam conta de que o trader seria do Citi. Posteriormente, os rumores apontavam que o erro teria sido em uma operação de venda envolvendo os papéis da P&G (Procter & Gamble) e da 3M, ambas gigantes do Dow Jones, com respectivos pesos de 4,32% e 6,02%.

Segundo a agência de notícias CNBC, o trader teria executado uma operação de venda na casa dos bilhões, ao invés do valor correto, que estaria nos milhões. Um simples erro de inserção de ordem, que estaria ocasionando um efeito dominó de sell-off nas bolsas do mundo. Veja a tabela abaixo, com a variação dos papéis do Dow Jones:

Queda das ações do Dow Jones

Ação

Peso no
Dow Jones

Mínima (US$)

Queda máxima no intraday*

Fechamento** (US$)

Fechamento**

IBM

8,86%

116,00

8,89%

123,92

- 2,78%

3M

6,02%

67,98

21,49%

84,24

- 2,7%

Chevron

5,58%

71,50

10,84%

77,20

- 3,73%

United Technologies

5,12%

65,17

11,44%

71,24

- 3,19%

Boeing

4,94%

62,00

12,68%

67,97

- 4,27%

McDonald´s

4,91%

67,49

4,49%

69,42

- 1,75%

ExxonMobil

4,60%

58,46

11,65%

63,89

- 3,45%

Caterpillar

4,59%

58,00

12,07%

63,50

- 3,73%

Johnson & Johnson

4,53%

60,03

7,84%

63,40

- 2,67%

Procter & Gamble

4,32%

39,37

36,66%

60,75

- 2,27%

Wal Mart

3,81%

51,53

5,92%

53,23

- 2,81%

Coca Cola

3,73%

51,21

4,57%

52,30

- 2,53%

Hewlett Packard

3,54%

41,94

17,65%

48,33

- 5,11%

Travelers

3,52%

48,53

4,69%

49,80

- 1,62%

American Express

3,09%

40,16

9,61%

42,50

- 4,34%

JPMorgan Chase

2,97%

39,29

7,83%

40,81

 - 4,38%

Dupont

2,63%

33,66

11,12%

36,69

- 3,12%

Merck

2,47%

30,70

13,74%

34,27

- 3,71%

Disney

2,46%

31,00

12,28%

34,01

- 3,76%

Home Depot

2,45%

32,07

9,00%

33,96

- 3,63%

Microsoft

2,08%

27,91

6,50%

28,98

- 2,91%

Kraft Foods

2,07%

27,49

7,60%

29,21

- 1,82%

Verizon Communications

1,99%

26,49

7,64%

28,01

- 2,34%

Cisco Systems

1,85%

23,23

12,50%

25,49

- 4,00%

AT&T

1,79%

24,04

6,71%

25,14

- 2,44%

Intel

1,54%

19,90

10,24%

21,51

- 2,99%

General Eletric

1,26%

15,00

17,13%

17,31

- 4,36%

Bank of America

1,22%

15,50

11,58%

16,28

- 7,13%

Pfizer

1,19%

15,85

7,74%

16,74

- 2,56%

Alcoa

0,87%

11,25

9,71%

11,94

- 4,17%

 

*Com base na variação entre o fechamento do dia 5 de maio e a mínima feita no intraday do dia 6 de maio
 ** Referente ao dia 6 de maio

A tabela mostra a disparidade do comportamento dos dois papéis quando comparados aos outros ativos que também compõem o índice: o recuo máximo registrado pelas ações da P&G chegou a 36,66%, ao passo que a maior queda apresentada pelos papéis da 3M foi de 21,49% - ambas por volta das 15h40 de Brasília.

Posicionamentos oficiais
A cada minuto, informações divergentes pontuavam a mídia norte-americana. Afinal, todos procuravam saber o porquê das súbitas quedas. “Não sabemos o que causou isto (...). Estamos investigando com a Nasdaq e outras bolsas”, chegou a afirmar Jennifer Chelune, porta-voz da P&G.

O que se sabe de certo até agora foi que, de fato, erros de ordens ocorreram. Rich Adamonis, porta-voz da NYSE (New York Stock Exchange) veio a público afirmar que “houve uma série de erros de trading”, sem, no entanto, revelar maiores detalhes. A Nasdaq anunciou que operações com variações superiores a 60% executadas no ápice das turbulências foram canceladas.

Por sua vez, a SEC (Securities Exchange Comission), o órgão regulador de mercados norte-americano, lançou comunicado dizendo estar trabalhando junto às bolsas e demais órgãos para “revisar a incomum atividade de negociação que aconteceu”. Paralelamente, a NYSE tomou medidas similares às da Nasdaq, cancelando trades muito atípicos.

Quanto às acusações de que o erro teria sido cometido por um funcionário do Citi, pouco se sabe até agora. A instituição financeira rapidamente manifestou-se a respeito, afirmando que, até aquele dado momento, não havia evidências nesse sentido. “Nós estamos, em conjunto com o restante da indústria financeira, investigando para encontrar a origem da volatilidade”, afirmou o Citi.

Os rumores de erros na inserção de ordens não param por ai. Minicontratos de índice futuro S&P 500 também são alvo de investigação pelas movimentações fora do comum, assim como as ações da Accenture, que também tiveram oscilação incomum. 

Também sobraram críticas aos sistemas eletrônicos responsáveis pela operações de algotrades, que disparam ordens instantaneamente dadas as oscilações dos ativos nos diversos mercados, e teriam assim alimentado o efeito manada visto naqueles minutos de muita agitação sem explicações plausíveis. 

Erros à parte, crise fiscal segue presente
Passadas as turbulências, o episódio ainda está longe de ser desvendado por completo, devendo permanecer no noticiário ainda por um bom tempo. Entretanto, para muitos analistas, ainda que seja confirmado o erro de trading, ele por si só não explica a dimensão da aversão ao risco que tomou investidores ao redor do mundo em questão de poucos minutos.

“Eventos espetaculares à parte, é a combinação de um mercado muito suscetível a pequenas mudanças, vendo que os piores cenários possíveis em relação à Europa podem se concretizar”, afirmou o economista Omero Guizzo, da LCA Consultores, à InfoMoney na noite passada.

Desta forma, embora seja importante destacar que o eventual erro, ou série de erros, cometido tenha, sem dúvidas, sido o responsável pelo espantoso ritmo de queda nas bolsas, o cenário negativo em si vem das dificuldades fiscais enfrentadas pelos países europeus e, portanto, não deve ser afastado tão cedo.